23 fevereiro 2021

PRÉ-MUNIÇÃO (Réquiem para um futuro próximo)

 

Eu, armado e cidadão de bem,

Fazendo minha própria filha assediada de refém.

Eu, armada e filha violada,

Exterminando meu algoz, numa emboscada.

 

Eu, armado e motorista,

Resolvendo briga de trânsito na pista.

Eu, armado e passageiro,

Disparando no condutor um tiro certeiro.

 

Eu, armado e marido,

Vingando meu orgulho ferido.

Eu, armada e mulher,

Punindo quem mal me quer.

 

Eu, armado e cristão,

Atacando outra religião.

Eu, armado e do candomblé,

Revidando o ataque à minha fé.

 

Eu, armado e adolescente,

Tirando a vida de um colega, num repente.

Eu, armado e pai ausente,

Escondendo meu ato inconsequente.

 

Eu, armado e filho drogado,

Ameaçando minha família por uns trocados.

Eu, armado e pai,

Querendo abafar os meus ais.

 

Eu, armado e homofóbico,

Matando o que, em mim, é óbvio.

Eu, armado e LGBTQI,

Calando quem não me quer por aqui.

 

Eu, armado e racista,

Apagando o que, na minha própria pele, está à vista.

Eu, armado e afrodescendente,

Revidando suas piadas indecentes.

 

Eu, armado e cidadão protegido,

Abastecendo o mercado pro bandido.

Eu, armado, infeliz e moribundo,

Num disparo, retirando-me do mundo.

 

“Requiem aeternam dona eis.”

 

Cláudia Ferreira

23 de fevereiro de 2021

10 fevereiro 2021

SEM CONFETES

                Este ano não tem Carnaval. Coisa estranha demais! Dois mil e vinte passou como um tsunami, levando esperanças e sonhos; trazendo dúvidas e receios. Tudo se resumiu ao medo do desconhecido e ao desassossego, afogando-nos numa tristeza que não sabemos explicar.

                Este ano não tem as marchinhas, os blocos, as bandinhas, a festa; não tem o gingado, a paquera, o banho de suor.

                Este ano não tem colombinas e pierrôs; não tem bate-bolas; não tem passistas; não tem porta-bandeiras e mestres-salas; não tem bateria; não tem enredo.

                Este ano não tem o samba no pé, a alegria, as luzes, a purpurina; não tem a música, o sorriso, nem a ilusão de dias melhores.

                No lugar disso tudo, surgem o tédio e o ódio encarcerados. Vão sumindo as marcas e a nossa identidade fica pra trás.

                Se o ano só começa após o Carnaval, o que faremos? Quando tiraremos a fantasia, para voltar ao trabalho e a tantas outras batalhas, se nem tivemos a chance de vesti-la?  Como encarar as cinzas que tomaram conta do mundo e parece que se perpetuarão em dois mil e vinte um, sem termos vivido o reinado de Momo, onde podemos fingir, por pelo menos três dias, que está tudo bem?


Cláudia Ferreira

10 de fevereiro de 2021

SOBRE NOSSOS PARLAMENTARES E TAIS

E vem aumentando a lista que se enquadra na máxima de que "político é tudo igual, nenhum presta". Nos últimos dias, nosso Congress...